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Notas sobre o texto “Por uma nova cinefilia” (Girish Shambu)

    Meu caro amigo, como havia te dito que faria, li o texto que você me indicou. E achei interessante o fato do autor levantar discussões que estão na ordem do dia. No entanto, para mim, ele peca em um aspecto: a observação fragmentada do cinema. E esse equívoco teórico-metodológico compromete todo o seu argumento. Explico-me.

    Veja bem, se o autor se motivou a escrever esse texto, o seu desejo não veio exclusivamente do cinema. Não foi ele, o cinema, que fez com que o seu olhar se voltasse para essa discussão. Foi, antes disso, evidentemente, um contexto social mais amplo. Não sei se estou me fazendo compreensível. O que quero dizer é que, para mim, o cinema é um fato social. E sendo um fato social eu não posso pensá-lo de modo isolado.

    Voltando ao texto, a discussão que o autor propõe demoniza o que ele chama de “velha cinefilia” (com origens que remetem aos desdobramentos da redação da Cahiers du Cinéma). Não percebendo, nesse caso, que o que ele chama de “velha cinefilia” foi um movimento de um espaço-tempo específico. Em um contexto em que o mundo era outro, e, consequentemente, pensava de forma diferente. Demonizar essa “velha cinefilia” é querer que alguém do anos 1950 tivesse a cabeça de hoje. E isso é anacrônico. É antinatural. Eu sei que ele propõe uma “nova cinefilia” no lugar da velha. Mas eu acho vago, meio bobo até. Não é preciso acionar o que ele chama de “nova cinefilia”.

    O cinema, como disse, pelo menos para mim, é um fato social. Sendo um fato social, ele caminha com as mudanças do mundo. Essa “nova cinefilia” é um caminho “natural” dado o espaço de contestação das identidades hegemônicas que se tornou o século XXI. Inclusive, é importante ressaltar, não se trata de algo que brotou da noite para o dia. Não. Isso tem sido construído, ao menos, desde os últimos cinquenta anos. É fruto dos Estudos Culturais e Pós-coloniais. Da Contracultura, dos movimentos feministas, LGBTs; e, inclusive, do Existencialismo e o Maio de 68. Tudo isso, junto, descambou no nosso contexto atual e tem feito do século XXI, como disse, o espaço de contestação das identidades hegemônicas. E que bom que tem sido assim.

    Por exemplo: basta olhar o Oscar, Cannes etc. para perceber que os grupos marginalizados, excluídos, cada vez mais, têm adentrado nos regimes de visibilidade. E tudo isso é muito urgente e necessário. E veja: tem ocorrido independentemente de um manifesto de uma “nova cinefilia”. Tem ocorrido porque esse tem sido o caminho “natural” do mundo contemporâneo. Dado, evidentemente, todo o terreno pavimentado pela Contracultura, o Existencialismo e o Maio de 68, os Estudos Culturais, os movimentos feministas, LGBTs etc., como disse anteriormente. E o cinema, por inércia, tem seguido o mesmo fluxo. E essa minha observação não é mera abstração, não. É como o mundo concreto tem se apresentado. A grande questão, quanto a isso, pelo menos para mim, é pensar outro aspecto: esses regimes de visibilidade têm sido suficientes para colocar os excluídos no centro do poder político, econômico, que é onde de fato se dá a exclusão? Do meu ponto de vista não. E o pós-modernismo, enquanto tentativa de teoria, não encontrará uma saída para isso: ele pensa os fenômenos de modo fragmentado.

    Retornando para o texto, no entanto, quero encerrar de modo sucinto. Centrando-me, apenas, em seu argumento basilar: o que quero dizer é que não há uma velha e uma nova cinefilia. Há, apenas, uma cinefilia em seu fluxo constante de evolução. A dialética, com seus processos de teses, antíteses e sínteses, por exemplo, é uma boa perspectiva teórico-metodológica para pensarmos sobre. Na prática, essa dicotomia não existe.

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